Claudinho

         Conheci o Claudinho no meu primeiro dia de trabalho como engenheiro formado, em Joinville-SC. 01 de outubro de 1999. E, por acaso ou destino, estamos trabalhando juntos até hoje, agora em Porto Real-RJ.
Antes trabalhamos juntos também em Curitiba, Durante esses 8 anos, só deixamos de trabalhar juntos por uns 4 ou 5 meses, quando ele foi trabalhar em São Paulo para um fornecedor de ferramentas de corte.

          Lembro muito bem desse primeiro dia. Eu era recém-formado em Engenharia Mecânica e tinha feito um estágio de 6 meses na área de ferramentas de corte em uma empresa que fabrica máquinas-ferramenta em Diadema – SP. Fui contratado para ajudar o Claudinho a organizar o setor de pre-setting da fábrica de usinagem. Quem me contratou foi um senhor chamado Luiz que era o gerente da fábrica de Usinagem e me disse que, dali em diante, eu seria chamado de Gustavo, pois já havia um Luiz, que era ele.
          Portanto, de um dia para o outro, eu me mudei de Florianópolis para Joinville e passei a ser chamado de Gustavo, coisa que eu demorei um pouco a acostumar. Ninguém, até então, me chamava de Gustavo. Era (e continua sendo) Rato, para os íntimos e conhecidos mais próximos, e Luís, para quem não me conhecia direito. (Agora, aqui em Porto Real, como já havia outro Gustavo, me chamam de Luís Gustavo). Luishxxx, com “s”, “h” e 3 “xxx”.
          Naquele primeiro dia de trabalho, lembro de ter achado o ambiente de fábrica muito hostil. Barulho, sujeira, calor, desordem, pessoas falando de maneira ríspida umas com as outras, pessoas visivelmente estressadas. Mas naquela época eu não tinha escolha. Havia estudado durante anos e finalmente me formado. Precisava do trabalho e do dinheiro.
          Fui apresentado ao Claudio, que me mostrou a (pouca) estrutura que existia da área de ferramentas e como era a rotina de trabalho. O setor de pré-setting de ferramentas foi montado para atender à uma linha de usinagem de blocos e cabeçotes de motor. Era um motor de 8 cilindros em “V” com 2 cabeçotes para cada bloco. Como infra-estrutura do setor havia uma sala de uns 30 m2 com um aparelho de pré-setting, uma mesa com um computador e uma cadeira, uma bancada para montagem das ferramentas e uma bagunça generalizada com gente entrando e saindo a cada minuto, às vezes xingando, pegando ferramentas sem anotar nada e reclamando de tudo e da vida. Eu mal abria a boca pra falar alguma coisa. Só observava.
          Naquele dia, lá pelas 19:00 horas, sugeri ao Claudio que alterássemos um pouco o layout da sala para melhorar o ambiente de trabalho e a organização das coisas. Ficamos lá até as 02:00 da manhã. Fui embora com a sensação de que tinha muito trabalho pela frente e em ritmo acelerado. Encarei como um desafio organizarmos aquele setor para que servisse de exemplo para o resto da fábrica.
          No segundo dia saí às 22:30.
          No terceiro saí às 23:00 e fui conhecer a PH, uma “casa de diversão” muito freqüentada. Dormi às 04:00 e levantei às 06:00.
          No quarto dia o Claudio me disse que estava de saco cheio daquela bagunça e que iria voltar para São Paulo. Eu disse pra ele que estava ali para ajudá-lo no que eu pudesse, apesar da minha falta de experiência. Não sei se minhas palavras valeram de alguma coisa para ele naquele momento. O fato é que ele acabou ficando.
          No quinto dia (sexta-feira) percebi que teria de trabalhar também no sábado e domingo.
          E assim os dias foram passando cheios de trabalho.
          Nos primeiros três meses de empresa fiz, em média, duzentas e vinte horas extras por mês. Isto significava, na prática, umas 14 horas de trabalho por dia, inclusive sábados e domingos.
          Me auto-sugeri outro desafio: em 6 meses criar as condições para que pudesse sair do trabalho no horário normal, as 17:30, e ir para casa descansar.
          A rotina era a seguinte: trabalhava de manhã e de tarde para não deixar a fábrica parar por falta de ferramentas e à noite, no “terceiro tempo”, ficava organizando as coisas: ajeitando a bagunça, padronizando trabalhos, criando e analisando gráficos de custos, fazendo no Access um banco de dados para as fichas de quebra de ferramentas e absorvendo a experiência do Claudinho, que desde os 15 anos já estava trabalhando dentro de fábrica.
          Aquela foi minha primeira experiência num chão de fábrica. Eu não estava acostumado àquela pressão toda. Gente berrando, tratando-se de maneira pouco amistosa. Muitas vezes fazendo uso das posições hierárquicas para desrespeitar subordinados.
          Tudo isso para mim era muito estranho. Eu me sentia deslocado naquele meio. Lembro que minhas mãos tremiam de nervosismo, ansiedade ou mesmo medo. Era um mundo selvagem onde prevalecia o ditado: manda quem pode, obedece quem tem juízo. Não era o mundo profissional imaginado por quem acabava de se formar na melhor faculdade de engenharia mecânica do país. É importante dizer, para os que não participaram daqueles dias, que o clima de trabalho nessa empresa atualmente, é bastante diferente e esse tipo de coisa não mais acontece com freqüência. Mas era o clima naqueles dias. E eu estava assustado com aquilo.
          Mas me adaptei.
          Citando Augusto dos Anjos: “O homem que entre feras vive sente inevitável necessidade de também ser fera”.
          Para sobreviver naquele meio tive que me virar. Aprendi muito observando o Claudio. Essas questões de comportamento, relacionamento e profissionalismo. Ele, apesar da pouca idade (na época estava com 23 anos) era muito hábil com esse tipo de situação. Ele tinha muita noção de prioridade, o que é importantíssimo para quem está num chão de fábrica. Também tinha a calma e a tranqüilidade necessária para expor suas opiniões de forma convincente. Ou seja, já aos 23 anos, agia como um profissional experiente.
          Com o Claudio aprendi muito do que sei sobre ferramentas de corte e usinagem. Já tinha uma base teórica boa da Universidade, onde trabalhei no laboratório de materiais, com metalurgia do pó e nitretação por plasma. Mas não tinha quase nenhuma experiência prática quando fui trabalhar lá.
          Trabalhar ali, e naquele ritmo, foi uma experiência profissional importantíssima para todos que souberam aproveitar. Tínhamos que fazer a linha rodar diariamente e, ao mesmo tempo, criar condições e estrutura para que as coisas fossem melhorando. Tivemos a confiança e a liberdade para testar várias ferramentas e criar rotinas de trabalho para a nossa área.
          O custo de ferramentas chegou a níveis razoáveis, a usinagem como negócio se viabilizou e em pouco tempo passou a ser a unidade com maior retorno percentual da empresa. Isso se deve muito ao direcionamento que foi dado pelo José Claudio (o gerente que assumiu o lugar do Sr. Luiz) e por todos nós, das diferentes áreas que fizemos nossa parte.
          Foi uma ótima escola para mim. E os grandes professores foram o Claudio, o Edemir e o José Claudio. Muito do que sei de usinagem aprendi observando e trabalhando com eles.
          O Claudinho é um exemplo de praticidade. Vai atrás do que quer. Faz, e não perde tempo se lamentando. Quando não sabe de um assunto que é relevante, vai atrás, estuda, se informa, procura quem sabe. E assim está se tornando, cada vez mais, um profissional conhecido e reconhecido no mundo da usinagem. Além disso, tem um talento fora do comum para o chamado “networking”. Conhece e tem bom relacionamento com muita gente no nosso ramo de trabalho, que é a usinagem.
          Como pessoa, é um dos casos raros de colegas de trabalho que eu posso chamar de amigo.
          Que continue assim.
          Grande abraço.

Boa sorte.

A você e à sua família.

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